Adenocarcinoma em divertículo duodenal

Mar de 2019.

Autor: Vanessa Mizubuti Brito¹

Colaboradores: Klaus Schumacher¹, Bruna Zaidan²

Orientador: Antônio Eustáquio Dantas da Silva Júnior³

 

Preâmbulo

O caso é uma apresentação típica em localização atípica e curiosa. Escolhemos esse caso por ilustrar especialmente a resolução espacial da ressonância magnética. 

História clínica

ID: paciente do sexo feminino, 64 anos.

HX: paciente relata dor epigástrica pós-prandial, do tipo cólica, há quatro meses, associado à náuseas e vômitos. Estava em tratamento para anemia ferropriva há 8 meses. Há cerca de 2 meses apresentou hematêmese, associado à melena e hipotensão, com necessidade de internação e hemotransfusão.

ExF: BEG, descorada +/4+, anictérica, acianótica, afebril.
Tórax: MV+ sem ruidos adventícios, BRNF 2 tempos sem sopros.
Abdome flácido, indolor à palpação RHA+.

Exames laboratoriais:

Hb

11.50 g/dL

FALC

82 U/L

Plaquetas

308.000 mm³

TGO

16 U/L

GGT

44 U/L

TGP

16 U/L

 

 

 

US de outro serviço: lesão ovalada em região de flanco direito sugestiva de espessamento parietal de alça intestinal.

EDA de outro serviço:

    1. esofagite não erosiva
    2. sem progressão ao nível do arco duodenal.

A seguir mostraremos as imagens do caso. Antes de visualizar o próximo tópico, tente interpretar os achados de imagem e formular algumas hipóteses diagnósticas.

 

Endoscopia digestiva alta

 

Tomografia computadorizada

 

Ressonância Magnética


 

As imagens mostradas acima serão revistas com as devidas explicações e serão acompanhadas de legendas que formalmente descreverão os achados mais relevantes.


Legenda: Tomografia Computadorizada (TC) em cortes axiais sem contraste (a), evidenciando lesão expansiva excêntrica, heterogênea na segunda porção duodenal (seta), que obstrui parcialmente a luz intestinal (cabeça de seta); nas fases portal (b) e excretora (c) apresenta realce heterogêneo ao meio de contraste (setas), com áreas de necroses e permeio (círculo).

Legenda: TC com contraste na fase portal em cortes axiais (a) e (b) demonstrando lesão expansiva na segunda porção duodenal (seta), com obstrução parcial da luz intestinal (circulo), resultando em estase gástrica (*). Nos cortes coronal (c) e sagital (d) esta lesão ocupa o interior de diverticulo duodenal com presença de interface gasosa entre suas paredes e a supracitada lesão (seta), não sendo observado dilatação de vias biliares (setas rachuradas), há, ainda, íntimo contato com a cabeça pancreática (colchetes).

Legenda: RM nas sequências ponderadas em T2 cortes coronal (a) e axial (b) evidenciando lesão expansiva excêntrica heterogênea na segunda porção duodenal que cresce para fora da formação diverticular no aspecto anteromedial.

Legenda: RM nas sequências ponderadas em T2 single shot: Corte coronal (a) evidencia lesão expansiva heterogênea de origem duodenal em íntimo contato com processo uncinado do pâncreas (seta) e axial (b)  apresentando cabeça, corpo e cauda pancreática preservadas (pontas de seta).

Legenda: RM nas sequências ponderadas em T2 Fiesta cortes coronal (a) e axial (b) observando-se dilatação do aspecto anteromedial da segunda porção duodenal com paredes bem delimitadas contiguas com a parede duodenal (setas), há lesão expansiva heterogênea em seu interior e presença de interface liquida entre elas (*).

Legenda: Estudo dinâmico com RM: (a) Corte coronal T1 pré- Gd; (b): Corte coronal pós- Gd arterial e (c): Corte axial pós-Gd tardio evidenciando realce heterogêneo pelo meio de contraste da lesão.

Legenda: Produto de ressecção cirúrgica com lesão expansiva recoberta por serosa no interior de formação diverticular, justaposta ao arco duodenal, quando seccionado, evidencia mucosa diverticular preservada e lesão vegetante invadindo sua luz.

 

Agora faremos uma associação entre os diferentes fenótipos que estudamos acima, para que possamos associar as imagens com a antomia patológica.

Legenda: Lesão expansiva heterogênea, que cresce para formação diverticular na segunda porção duodenal ao exame TC (A), de aspecto similar ao estudo de RM (B), em concordância com a peça cirúrgica (C).

Legenda: Observa-se lesão vegetante que obstruía parcialmente a luz duodenal ao exame de EDA (A), prosseguiu-se com exame de imagem onde evidenciou-se lesão expansiva obstruindo parcialmente a luz da segunda porção duodenal (B). Paciente foi submetida à tratamento cirúrgico, com peça cirúrgica evidenciando o aspecto vegetante da lesão (C).

Legenda: RM evidenciando lesão expansiva ocupando divertículo duodenal (A), ao zoom nota-se interface liquida entre a parede duodenal e a lesão (B), achado este confirmado ao estudo anatomopatológico (C), onde se observa as camadas muscular e mucosa da parede diverticular preservadas (1), presença de espaço entre a parede diverticular e a lesão (2), que no caso é adenocarcinoma (3).

CONCLUSÃO

Trouxemos hoje um raro caso de adenocarcinoma periampular sem determinar obstrução de vias biliares e com crescimento para divertículo duodenal. Tal comportamento clínico (oligossintomático) pode ter dificultado o diagnóstico precoce, uma vez que a paciente apresentava sintomatologia inespecífica.

O caso se mostra na interface radio-histológica, onde o comportamento de sinal na RM ilustra perfeitamento tanto o posicionamento anatômico como a natureza tecidual.

A história clínica e o exame físico orienraram a realização da endoscopia digestiva alta, que identificou a lesão. Os exames de imagem auxiliaram o estadiamento loco regional da doença e o planejamento cirúrgico.

 


¹ Médico residente do Departamento de Radiologia da Faculdade de Ciências Médicas – FCM / UNICAMP.

² Médica patologista formada pela FCM / UNICAMP.

³ Médico Radiologista assistente do Departamento de Radiologia da Faculdade de Ciências Médicas – FCM / UNICAMP.

. Adenocarcinoma em divertículo duodenal. Dr.Pixel. Campinas: Dr Pixel, 2019. Disponível em: https://drpixel.fcm.unicamp.br/conteudo/adenocarcinoma-em-diverticulo-duodenal. Acesso em: 21 Nov. 2024