Hemangioblastoma Intracraniano

Mai de 2021.

Caso Clínico:

Paciente do sexo feminino de 49 anos chama ao serviço de pronto-atendimento com queixa de diplopia e cefaleia hemicraniana à direita intensa e pulsátil há 9 dias. Apresenta pressão alta em uso de medicação anti-hipertensiva. No exame de fundo de olho notado edema de papila bilateral. Realizada tomografia de crânio para avaliação de hipertensão intracraniana e posteriormente, após tratamento e estabilização clínica, ressonância magnética para melhor elucidação etiológica.

 

Achados de Imagem do caso:

Tomografia computadorizada:

-Lesão sólido cística na periferia do hemisfério cerebelar direito, com nódulo mural sólido excêntrico posterior hipervascularizado. Determina obstrução do IV ventrículo com hidrocefalia e transudação ependimária à montante.

 

Conceito importante: a transudação ependimária é um tipo de edema cerebral que ocorre quando há aumento da pressão intraventricular caracterizada pelo rompimento do revestimento ependimal ventricular permitindo a migração de fluído cefaloraquidiano para o parênquima cerebral adjacente aos ventrículos. Normalmente é observada nos ao redor dos ventrículos laterais no contexto de hidrocefalia obstrutiva aguda. Na tomografia é notada como hipoatenuação na região periventricular com apagamento dos sulcos corticais adjacentes, além das alterações relacionados com hidrocefalia. 
Corte axial de tomografia computadorizada mostrando hidrocefalia com sinais de transudação ependimária adjacente aos ventrículos laterais, notadamente no corno frontal direito.

 

Figura 1: Corte sagital de tomografia computadorizada de crânio mostrando lesão sólido-cística na periferia do hemisfério cerebelar direito com realce do nódulo mural (seta). A – fase sem contraste. B – fase com contraste.

 

Ressonância Magnética:

-Lesão expansiva intra-axial centrada na periferia do hemisfério cerebelar direito com componente predominantemente cístico caracterizado por supressão incompleta em FLAIR (conteúdo hiperproteico) e área sólida excêntrica com realce homogêneo pelo meio de contraste.

 

Figura 2: Corte sagital de ressonância magnética de crânio mostrando lesão sólido-cística na periferia do hemisfério cerebelar direito com realce do nódulo mural (seta). A – Sequência pesada em T1. B –Sequência pesada em T1 após o uso de contraste (Gadolíneo).

 

Hipótese Diagnóstica: Hemangioblastoma intracraniano, considerar contexto clínico de síndrome de von Hippel Lindau.

 

Patologia:

-Tumores de origem vascular que podem ocorrer esporadicamente e em paciente com von Hippel Lindau.

-Tumores grau I da Organização Mundial de Saúde que podem ocorrer tanto no sistema nervoso central quanto nos rins, fígado e pâncreas.

-Maioria dos casos intracraniano na fossa posterior e nos hemisférios cerebelares, podendo mais raramente ser observado supratentorial nas radiações ópticas em pacientes com von Hippel Lindau.

 

Apresentação Clínica:

-Cefaleia: sintoma de apresentação mais comum;

-Hidrocefalia e sintomas de hipertensão intracraniana.

-Disfunção cerebelar.

-Alteração do nível de consciência.

 

Epidemiologia:

-Tipicamente observados em adultos de meia-idade (30-60 anos), sendo o tumor intra-axial infratentorial mais comum na faixa etária.

-Discreta predileção pelo sexo masculino.

-Casos esporádicos consistem em 75-60% dos observados, sendo o restante relacionado com von Hippel Lindau.

 

Associações:

-Doença de von Hippel Lindau:  relacionada com desenvolvimento de númerosas neoplasias benignas e malignas em diferentes órgãos por mutações em gene supressor tumoral do cromossomo 3. Destacam-se feocromocitoma, múltiplos carcinomas de células renais e angiomiolipomas renais.

 

Achados de imagem:

Tomografia computadorizada:

-Nódulo mural insodenso ao tecido encefálico na fase sem contraste com cisto de atenuação fluida circundante, e com realce homogêneo na fase pós-contraste.

-As paredes císticas normalmente não apresentam realce pelo meio de contraste.

-Calcificações são incomuns.

 

Ressonância Magnética:

-T1: Nódulo mural pode ser inso ou hipointenso

-T1 após contraste: realce intenso do nódulo e parede cística sem realce.

-T2: nódulo mural hiperintenso sendo possível observar flow voids por vasos alargados na periferia do cisto, este último apresenta sinal semelhante ao LCR.

 

Complicações:

-Obstrução do sistema ventricular com hidrocefalia e hipertensão intracraniana.

 

Diagnósticos Diferenciais:

-Metástases;

-Astrocitoma: pilocistico em crianças e glioblastoma em adultos.

-Ependimoma;

-Lesões vasculares: má formação arterio-venosa, cavernoma com sangramento subagudo.

-Meduloblastoma.

 

Tratamento e prognóstico:

Ressecção cirúrgica normalmente é considerada curativa, sendo observada recorrências em até 25% dos pacientes dependendo se ressecção completa ou incompleta.

 

 

Referências:

Lee, S. R., Sanches, J., Mark, A. S., Dillon, W. P., Norman, D., & Newton, T. H. (1989). Posterior fossa hemangioblastomas: MR imaging. Radiology, 171(2), 463–468. doi:10.1148/radiology.171.2.2704812.

 

Seeger, J. F., Burke, D. P., Knake, J. E., & Gabrielsen, T. O. (1981). Computed tomographic and angiographic evaluation of hemangioblastomas. Radiology, 138(1), 65–73. doi:10.1148/radiology.138.1.7192875.

 

Slater A, Moore NR, Huson SM. The natural history of cerebellar hemangioblastomas in von Hippel-Lindau disease. AJNR Am J Neuroradiol. 2003;24 (8): 1570-4.

 

Ho VB, Smirniotopoulos JG, Murphy FM et-al. Radiologic-pathologic correlation: hemangioblastoma. AJNR Am J Neuroradiol. 13 (5): 1343-52.

WERTHEIMER, Guilherme. Hemangioblastoma Intracraniano. Dr.Pixel. Campinas: Dr Pixel, 2021. Disponível em: https://drpixel.fcm.unicamp.br/conteudo/hemangioblastoma-intracraniano. Acesso em: 22 Dez. 2024
Guilherme Soares de Oliveira Wertheimer

Possui graduação em Ciências Biológicas-Modalidade médica pela Universidade Federal de São Paulo (2007-2010) com ênfase em Neurociências. Graduação em Medicina na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) (2012-2017) com cursos internacionais, trabalhos extracurriculares e de iniciação científica em Neuroimagem. Atualmente residente de Radiologia e Diagnóstico de Imagem na UNICAMP (2019-2022).

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