Fragmentos metálicos de projétil de arma de fogo sugerindo calcificações suspeitas na mamografia

Mar de 2016.

Autora: Mariana Meira Vieira

Orientador: Orlando José de Almeida

                                                                                                                                                                                                


         

História clínica

Paciente do sexo feminino, 70 anos, assintomática, encaminhada da rede básica de saúde ao serviço de referência em mastologia  por achados suspeitos na mamografia de rastreamento. Foram identificadas microcalcificações puntiformes com distribuição segmentar no quadrante ínfero-medial da mama esquerda, classificadas inicialmente como BI-RADS® 4, o que indicaria estudo histopatológico.

Foram realizadas incidências mamográficas complementares. O aspecto das calcificações chamou a atenção pelo brilho intenso, não habitual em calcificações suspeitas. A paciente foi então examinada clinicamente pelo médico radiologista, que identificou duas cicatrizes na mama esquerda. A paciente revelou que há mais de 10 anos foi atingida por um projétil de arma de fogo que teve ponto de entrada e de saída na mama esquerda. Pela descrição da paciente e localização das cicatrizes, o projétil passou pelo quadrante ínfero-medial.

Os achados foram reclassificados como benignos (BI-RADS 2) e a paciente foi reencaminhada a Unidade Básica de Saúde, para continuar com o rastreamento mamográfico bianual.


Imagens do caso

 

 

Descrição das imagens

 

Exame realizado com a técnica digital CR (Computed Radiography), nas incidências médio-lateral oblíqua e crânio caudal bilateral. Mamas compostas por parênquima fibroglandular disperso. Pele, subcutâneo e complexos aréolo-papilares sem alterações. Calcificações benignas esparsas. Pequenos fragmentos metálicos no quadrante ínfero-medial da mama esquerda (resíduos projétil de arma de fogo). Linfonodos habituais em prolongamentos axilares. Achados mamográficos benignos, categoria BI-RADS 2.

 


 

Discussão do caso

A mamografia é o principal método de imagem para diagnóstico precoce do câncer de mama, contudo a presença de artefatos pode reduzir a sensibilidade e especificidade do método e levar a condutas inapropriadas (1). Conforme um programa de acreditação do American College of radiology (ACR), em que foram analisados 2.341exames de mamografia, os artefatos foram reportados como o sexto problema em ordem de importância, sendo responsáveis por 11% das falhas no exame (2).

Estudos atuais apontam para uma melhor acurácia diagnóstica da mamografia digital em relação ao filme mamográfico convencional para o rastreamento da população geral. Uma das vantagens está na eliminação dos artefatos relacionados ao filme, como sujeira e ruídos estruturais causados pelo seu processamento (3). Porém o uso da mamografia digital não elimina os artefatos relacionados com a técnica de realização do exame e os artefatos relacionados aos pacientes (3).

Os principais artefatos relacionados às pacientes decorrem da superposição de objetos ou substâncias tais como partes do corpo, jóias, roupas, cabelo, dispositivos médicos implantados, corpo estranho ou substância na pele que contenham materiais como zinco, alumínio e magnésio, que são radiopacos aos raios X e podem simular microcalcificações (4,5).

Os corpos estranhos como clipes metálicos, fragmentos metálicos por ferimento por arma de fogo, implantes médicos devem questionados e salientados pela paciente. Tais artefatos podem representar empecilhos a um diagnóstico mamográfico fiel (6). Imaginologistas devem estar familiarizados com a gama de artefatos existentes e devem também ser aptos ao rápido reconhecimento de sua fonte, minimizando, assim, custos e exposição do paciente a procedimentos invasivos desnecessários (7,8).

Nesse caso clínico, os fragmentos metálicos de projétil de arma de fogo simularam microcalcificações BI-RADS 4, o que implicaria a necessidade de biópsia. Contudo, o rígido controle de qualidade da imagem mamográfica, a correlação com os achados clínicos e a experiência do médico imaginologista fizeram com que os achados mamográficos fossem associados a fragmentos metálicos por projétil de arma de fogo.

O presente caso relatado revela que a busca ativa de prevenção e detecção de artefatos reduzem a incidência de erros diagnósticos e os custos, devendo ser o objetivo de toda equipe do serviço de mamografia.

 


Referências

  1. Pisano ED, Hendrick RE, Yaffe MJ, et al. Diagnostic accuracy of digital versus film mammography: exploratory analysis of selected population subgroups in DMIST. Radiology. 2008; 246:376-83.
  2. Nascimento FBD, Pitta MGDR, Rêgo MJBDM. Análise dos principais métodos de diagnóstico de câncer de mama como propulsores no processo inovativo. Arquivos de Medicina. 2015; 29(6), 153-159.
  3. de Souza Sabino SMP, Watanabe AHU, da Costa Vieira RA. Qualidade do exame de mamografia em rastreamento mamográfico. Rev Bras Mastologia. 2013; 23(2), 31-35.
  4. Chaloeykitti L, Muttarak M, Ng KH. Artifacts in mammography: way to identify and overcome them. Singapore Med J. 2006;47:634-41.
  5. LinksGeiser WR, Haygood TM, Santiago L, et al. Challenges in mammography: Part I, artifacts in digital mammography. AJR Am J Roentgenol. 2011;197:1023-30.
  6. Caldas FAA, Isa HLVR, Trippia AC, et al. Controle de qualidade e artefatos em mamografia. Radiol Bras. 2005;38:295-300.
  7. Badan GM, Roveda Júnior D, Ferreira CAP, et al. Auditoria interna completa do serviço de mamografia em uma instituição de referência em imaginologia mamária. Radiol Bras. 2014;47:74-8.
  8. Avelar MS, Almeida O, Alvares BR. Mammographic artifact leading to false-positive result. Radiologia brasileira. 2015; 48(3), 198-199.
. Fragmentos metálicos de projétil de arma de fogo sugerindo calcificações suspeitas na mamografia. Dr.Pixel. Campinas: Dr Pixel, 2016. Disponível em: https://drpixel.fcm.unicamp.br/conteudo/fragmentos-metalicos-de-projetil-de-arma-de-fogo-sugerindo-calcificacoes-suspeitas-na-mamografia. Acesso em: 29 Mar. 2024