
Fundamentos da propedêutica por imagem da mama
Autor: Prof. Dr. Rodrigo Menezes Jales
Nessa aula descrevemos de forma sucinta as indicações e a técnica dos principais exames utilizados na propedêutica mamária: Mamografia, Ultrassonografia e Ressonância Magnética.
Mamografia
Principais indicações
- rastreamento de mulheres com risco habitual para o câncer de mama (mamografia de rastreamento)
- classificação quanto ao risco de malignidade (BI-RADS) das lesões identificadas no rastreamento ou pela palpação (mamografia diagnóstica)
A mamografia é a única modalidade de rastreamento populacional para o de câncer de mama que comprovadamente reduz a mortalidade por câncer de mama. A redução da mortalidade atribuída ao rastreamento mamográfico organizado é de cerca de 20%. No rastreamento organizado ocorre a convocação e a vigilância das mulheres rastreadas. No Brasil, o Sistema Único de Saúde (SUS) adota o modelo de rastreamento oportunístico, no qual as mulheres são avaliadas apenas se procuram espontaneamente o sistema de saúde.
Segundo as diretrizes do Instituto Nacional do Câncer publicadas em 2015, as mulheres com risco de mama habitual devem ser rastreadas pela mamografia a cada 2 anos (bienal) entre os 50 e os 69 anos.
2- Técnica do exame
A mamografia é realizada em um aparelho de raio-x desenvolvido especificamente para a exposição das mamas: o mamógrafo (Figura1).
Figura 1 - Principais componentes do mamógrafo.
RX = Raio-X; MGC = mamografia convencional; CR = Computing Radiology;
Posicionamento mamográfico
Na modadlidade de rastreamento o exame é realizada em 2 incidências ortogonais em cada mama: a incidências mediolateral-oblíqua (MLO) e a incidência craniocaudal (CC). A incidência MLO é responsável pela exposição da maior parte do parênquima fibroglandular, incluíndo os quadrantes laterais, onde está a maior parte das neoplasia malignas das mamas. Os principais objetivos para a inclusão da incidência craniocaudal na rotina do rastreamento mamográfico são:
- confirmar ou descartar achados da incidência MLO. Alterações que se repetem em duas incidências ortogonais costumam ser mais relevantes
- caracterizar os achados da incidência MLO como laterais ou mediais. Através da incidência MLO só é possível determinar se as lesões são superiores ou inferiores.
- expor adequadamente os quadrantes mediais, que podem não ser adequadamente expostos na incidência MLO. A pequena espessura da mama nos quadrantes mediais dificulta a exposição pela MLO.
Para que a mamografia detecte lesões iniciais é fundamental que o posicionamento das mamas no mamógrafo seja realizado da maneira recomendada. As lesões mamárias não podem ser diagnosticadas se elas não forem expostas durante o exame. Assim, a primeira conduta do médico ao receber exames mamográficos deve ser a confirmação do posicionamento adequado. Exames realizados fora dos padrões devem ser repetidos.
Posicionamento na incidência mediolateral-oblíqua (MLO)
Figura 2 - A incedência MLO realizada com o posicionamento adequado deve mostar a papila perfilada (A); o músculo peitoral maior identificado na linha retropapilar (B) e o sulco inframamário (C).
Posicionamento na incidência craniocaudal (CC)
Figura 3 - A incidência CC privilegia os quadrantes mediais. Os critérios para o bom posicionamento da incidência CC são a papila centrada e perfilada (A) e a identificação da gordura retroglandular nos quadrantes central e medial.
Técnica radiológica
A identificação de lesões mamárias em estágio inicial depende do contraste entre a lesão e o plano de fundo. O alto contraste necessário na mamografia é obtido pela técnica de baixa kilovoltagem (Kv) e alta miliamperagem (mA).
Figura 4 - A mamografia deve fornecer imagens com alto contraste. Em outras aplicações, como o raio-X de tórax, os exames são realizados com técnicas de baixo contraste, a qual fornece imagens em múltiplos tons de cinza.
Anatomia radiológica
As figuras a seguir mostram mamografias da mama direita nas incidência MLO e CC. Através delas é possível identificar o parênquima fibroglandular heterogeneamente denso entre as gordurar pré-glandular (subcutâneo) e retro-glandular. A linha densa da pele é bem visibilizada nas duas incidências, o que só é possível através da tecnologia digita. Na mamografia convencional (analógica) a linha da pele não é rotineiramente individualizada.
Figura 5 - Anatomia radiológica de mamografia na incidência MLO da mama direita.
Figura - 6 Anatomia radiológica de mamografia na incidência CC da mama direita.
Sensibilidade
O câncer de mama apresenta densidade radiográfica semelhante ao parênquima fibroglandular, o que dificulta o diagnóstico em mulheres com predomínio do parênquima fibroglandular.
Figura 7 - A mamografia apresenta maior sensibilidade no diagnóstico dp câncer de mama em mulheres com predomínio adiposo (A). O diagnóstico mamográfico costuma ser mais difícil em mulheres com mamas em que há o predomínio do parênquima fibroglandular (B).
Ultrassonografia mamária
1. Principais indicações
As principais indicações da ultrassonografia mamária são:
- rastreamento complementar em mulheres com mama densa e alto risco para câncer de mama
- avaliação de nódulos palpáveis em mulheres fora da idade do rastreamento mamográfico
- análise de imagens duvidusas à mamografia.
- a ultrassonografia é o método de escolha para guiar procedimentos invasivos como a biópsia percutânea de fragmento (core) e a marcação .
Figura 8 - Uma das principais indicações da ultrassonografia mamária é o exclarecimento de dúvidas nos exames mamográficos. Nesse exemplo está marcado por um circulo vermelho nas incidências MLO (A) e CC (B) um nódulo no quadrante súpero-lateral da mama esquerda. A margem do nódulo é obscurecida pelo parênquima fibroglandular adjacente. A ultrassonografia (C) dirigida ao achado mamográfico revelou uma imagem oval, anecoica e circunscrita, típica de um cisto simples, que é um achado tipicamente benigno.
Figura 9 - Procedimento de biópsia percutânea de fragmento (core) sob aestesia local e localização ultrassonográfica.
2. Ténica do exame
O exame é realizado com a paciente posicionada em decúbito dorsal, com as mãos atrás da cabeça. Deve ser utilizado o transdutor linear, que ao trabalhar com ondas de alta frequência e baixa amplitude fornece imagens das estruturas superficiais com alta resolução.
Figura 10 - Técnica para a ultrassonografia da mama direita.
O câncer de mama apresenta ecotextura hipoecoica (cinza) , enquanto o parênquima fibroglandular habitualmente é ecogênico (cinza claro). Dessa maneira, diferente da mamografia, o diagnóstico do câncer mamário por meio da ultrassonografia não é prejudicado em mulheres com predomínio do parênquima fibroglandular.
Figura 11 - O diagnóstico do câncer de mama pode ser prejudicado em mulheres com predomínio do parênquima fibroglandular (A). O mesmo não occorre com a ultrassonografia mamária (B).
Anatomia ultrassonográfica
A gordura retroglandular apresenta espessura afilada à ultrassonografia devido à compressão das estruturas prufundas devido ao posicionamento da paciente e à compressão promovida pelo transdutor. Maiores detalhes sobre a sonoanatomia da mama podem ser acessados na aula ANATOMIA ULTRASSONOGRÁFICA DA MAMA
Figura 12 - Anatomia mamária na ultrassonografia panorâmica.
Ressonância Magnética mamária
Indicações
As principais indicações da ressonância magnética das mamas são:
- Rastreamento complementar de mulheres com alto risco para câncer de mama (> 20% ao longo da vida ou 1,7% em 5 anos; mulheres com mutação do BRCA 1 ou BRCA 2 ou com parentes de primeiro com mutação comprovada; mulheres com antecedente de irradiação do tórax entre 10 e 30 anos de idade).
- Estadiamento locoregional para definição cirúrgica de pacientes com diagnóstico carcinoma lobular invasivo.
- Carcinoma oculto da mama: diagnóstico de metástase linfonodal axilar sem tumor conhecido na mama.
- Avaliação de implantes de silicone mamário quando houver dúvida clínica, mamográfica ou ultrassonográfica sobre a integridade do implante.
Técnica
O exame é realizado com a paciente em decúbito ventral. Devido ao intenso campo magnético o exame é contraindicado em algumas situações:
- marcapasso ou desfibriladores cardíacos implantados
- clipes cerebrais
- implantes cocleares
- fragmentos metálicos no globo ocular
Com exceção dos exames indicados apenas para a avaliação de implantes ou próteses mamárias, o exame de ressonância magnética das mamas deve ser realizado com a administração de contraste paramagnético à base de gadolínio. As reações alérgicas ao gadolínio são bem mais raras do que as reações ao contraste iodado, usado nos exames de tomografia computadorizada. Entretanto, a injeção de contraste a base de gadolínio em pacientes com insuficiência renal já foi associada a uma rara doença dermatológica, a fibrose nefrogênica sistêmica. Por essa razão, o exame com contraste usualmente só é indicado em pacientes com clearence de creatinina > 60 mL/min/1,72m2. Em pacientes com clearence de creatinina < 60, deve ser avaliada a relação entre o risco entre a fibrose nefrogênica sistêmica e o benefício do exame.
Além disso, não é possível realizar o exame em pacientes com claustrofobia ou impossibilidade de permanecer imóvel pelo tempo do exame, cerca de 30 minutos.
Figura 13 - Posicionamento da paciente para a realização do exame de ressonância magnética das mamas.
Na interpretação do exame de ressonância magnética mamária é fundamental a avaliação da sequência com subtração pós contraste., na qual as imagens com hipersinal (brancas) correspondem às estruturas que captaram o contraste paramagnético. Na ressonância mamária a captação homogênea do contraste está relacionada à benignidade. O realce heterogêo e periférico é considerado suspeito.
Figura 14 - Realce pós contraste homogêneo de nódulo oval e circunscrito na mama direita (seta) avaliado em imagem axial com subtração pós contraste sugestivo de benignidade.
Figura 15 - Ressonãncia magnética mamária em corte axial revelando colapso do elatômero à direita (A) sugestivo de rotura intracapsular (sinal do linguini). Notar à esquerda o aspecto do implante de silicone sem alterações (B).